Construtoras apostam no BIM 4D para melhorar assertividade do planejamento de obras


Embora ainda seja incipiente, a utilização do Building Information Modeling (BIM) pelas construtoras brasileiras aos poucos avança em sofisticação, indo além de funcionalidades como a geração de modelos virtuais tridimensionais e a possibilidade de verificação de interferências nos projetos (clash detection). A evolução aponta principalmente para a integração com as ferramentas de planejamento, o chamado BIM 4D. Nele, às três dimensões espaciais que compõem o modelo 3D, é acrescida a variável tempo, tornando-se possível incorporar ao modelo informações sobre cronograma, sequência de obra e fases de implantação. Paralelamente surgem iniciativas que visam a aproximar o BIM dos canteiros, para que informações obtidas junto às frentes de trabalho, sejam de progresso ou de atraso de atividade, possam automaticamente municiar as equipes de planejamento, facilitando a tomada de decisão sobre as intervenções necessárias, gerando mínimo impacto nos cronogramas. Também ocorrem simultaneamente experiências em direção ao BIM 5D, que integra às outras variáveis o custo, permitindo que o modelo seja utilizado para gerar quantitativos e orçamentos.
"A ideia é vincularmos as informações dos componentes que representam o escopo do projeto às informações de planejamento e custo. Isto nos dá mais precisão sobre a quantidade de cada serviço a ser executada, permite a simulação de cenários e nos auxilia na definição do planejamento", explica Joyce Delatorre, coordenadora do Núcleo BIM da Método Engenharia. "Com estas informações integradas, se tivermos qualquer alteração de projeto, conseguimos rastrear o impacto no prazo e no custo da obra, auxiliando na tomada de decisão", continua a engenheira.
Ao permitir visualizar virtualmente e mais facilmente a progressão da obra, espera- se que o BIM integrado ao planejamento gere controles mais assertivos sobre os prazos de execução. Fernando Augusto Corrêa da Silva, diretor da Sinco, explica que tal precisão decorre principalmente da maior confiabilidade das informações do modelo e da possibilidade oferecida às equipes de planejamento de explorar diversas formas de executar a obra, escolhendo entre as opções existentes a melhor estratégia de ação.
"Além disso, diferente do que ocorre tradicionalmente, decisões que provavelmente seriam tomadas num segundo momento são antecipadas para a etapa de projetos. É o caso da logística interna do canteiro e de simulações de conflitos entre serviços", compara Diogo Linhares de Camargo, sócio-diretor da Porto Camargo, construtora e incorporadora paranaense que utiliza, pela primeira vez, o BIM 5D (que também inclui a variável custo) na construção de um edifício residencial em Curitiba. Ele conta que simulações subsidiaram a tomada de algumas decisões, como a definição da quantidade de operários para a realização das atividades, a definição da sequência de execução das obras, o estudo de logística de canteiro, e até as análises de custos das soluções para fachadas.

Uso seletivo
Integrar o BIM ao planejamento pode induzir ganhos consideráveis para quem utiliza sistemas construtivos pré-fabricados e trabalha com prazos de execução exíguos. "Em obras com alto grau de industrialização, como as que fazemos, a modelagem tem um importante papel no dimensionamento e na operação dos equipamentos de movimateria mentação e também ajuda a programar com mais precisão a entrega dos pré-fabricados", comenta Marcelo Pulcinelli, diretor de engenharia da Matec.
Ele conta que o BIM é utilizado em função da complexidade do projeto em questão na Matec. "Um galpão simples pode não justificar o investimento em uma modelagem completa. Ou corre-se o risco de a obra ficar pronta antes do modelo. Já em outros projetos, os ganhos podem ser enormes com a modelagem dos trechos de maior criticidade e com maior grau de interferências", explica, citando como exemplo edifícios com alta densidade de instalações prediais.
Thais Mazziotti Salomão de Paula, coordenadora de Projetos da Odebrecht Realizações Imobiliárias (OR), reforça que a utilização do BIM 4D pode ser bastante flexível. Segundo ela, é possível utilizar a metodologia para fazer modelos bem simples e simular o plano de ataque da obra de modo geral, ou para elaborar modelos mais detalhados para simular o ataque a uma etapa específica, como, por exemplo, a vedação.

Sintonia fina
Para que tudo isso funcione, não basta construir uma sofisticada base tecnológica com um pool de softwares e licenças. As equipes de projeto, planejamento e orçamento precisam trabalhar de forma integrada. Eis o primeiro grande desafio para a maioria das construtoras.
Na Camargo Corrêa Desenvolvimento Imobiliário (CCDI), a necessidade de integração levou a empresa a rever todos os processos internos das equipes envolvidas (planejamento, orçamento, engenharia). "Isso porque o que cada equipe faz hoje é diferente do que fazia antes. Não basta mais fazer só para a sua área. É preciso pensar no conjunto", explica Luiz Augusto Lervolino Pereira, diretor de Engenharia e Sistemas de Gestão da CCDI.
O grande desafio, explica Thais de Paula, é que, para haver a integração efetiva, os modelos não podem ser produzidos de modo aleatório. Eles precisam conter uma série de informações qualificadas demandadas pelo software de planejamento para a produção de gráficos e cronogramas. Na OR isso foi equacionado após meses de muita conversa e reuniões, antes de se iniciarem as modelagens.
É fundamental, portanto, que o projeto nasça modelado de forma a atender às necessidades das etapas posteriores, no caso, do planejamento e do orçamento. "As equipes de projetos devem estar totalmente aderidas ao processo executivo da construtora", reforça Fernando Corrêa da Silva, lembrando que, quanto mais o modelo refletir sua execução, maior será o sucesso de sua aplicação.
Outra barreira que gradativamente vem sendo superada é a tecnológica. Desenvolver projetos em BIM exige a interoperabilidade de um conjunto de softwares e aplicativos. Na CCDI, onde o BIM é a base de operação para as áreas de planejamento, orçamento, suprimentos, gestão de contratos e controle da qualidade, trabalham conjuntamente nove softwares de mercado, além de um sistema (ERP) próprio que funciona como centralizador, tradutor e intérprete.
Diante de múltiplas tecnologias, o caminho escolhido por muitas empresas foi utilizar o Industry Foundation Classes (IFC) e exportadores diretos entre as ferramentas. Joyce Delatorre, da Método, conta que boa parte das informações são facilmente compartilhadas entre os sistemas. Porém, ainda há perdas de informação com o IFC. "Para contornar isso, definimos diretrizes de modelagem para garantir o uso apenas de componentes auditados. Todo modelo BIM, desenvolvido internamente ou pelos projetistas, passa pelo nosso controle da qualidade interno para garantir a confiabilidade dos dados", revela.
Se por um lado há esses desafios, um facilitador importante é a aderência e o entusiasmo dos profissionais, sobretudo dos recém-formados, em relação à nova tecnologia. "Mas isso não exclui a necessidade de investirmos em capacitação para uso da metodologia BIM, que envolve novos fluxos e relações de trabalho", salienta Delatorre.

Fluxos de produção
Ainda que o BIM possibilite visualizar a execução da obra e permita o estudo de várias alternativas, a metodologia sozinha não fará mágicas no planejamento. A afirmação é do engenheiro Leonardo Manzione, diretor da Coordenar e professor de cursos de MBA da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP).
A extração de informações do modelo, como quantitativos de materiais,
é um dos recursos que podem ser explorados na plataforma BIM
Manzione cita estudos do professor Carlos Formoso, da Universidade Federal do Rio Grande do sul (UFRGS), que revelaram que somente 30% do tempo de uma obra é utilizado para os processos produtivos. Os outros 70% são desperdiçados em processos que não agregam valor diretamente, como fluxos logísticos, atividades de inspeção, retrabalhos e fluxos de informação (o tempo que as pessoas perdem para saber o que, quando e como fazer as coisas).
"Esse conjunto de atividades não agregadoras ainda não é contemplado nos softwares de 4D, pois o paradigma que eles utilizam é a reprodução do cronograma de Gantt associado com os objetos BIM", comenta Manzione, que enxerga impactos positivos do BIM na medida que a capacitação da equipe de planejamento e de obra, trabalhando juntas, consigam desenvolver um projeto do sistema de produção, onde os fluxos de materiais e de transportes sejam visualizados com o apoio do modelo 3D.Para isso, as ferramentas disponíveis podem oferecer diferentes abordagens. "Mas o planejador, qualquer que seja a ferramenta escolhida, tem a oportunidade de planejar e visualizar o layout do canteiro de produção da obra e, a partir daí, planejar e otimizar os fluxos logísticos organizando as atividades por seu fluxo de valor, não apenas pela sua sequência cronológica", conclui Manzione.

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